Sinais para Reconhecer a Religião Revelada
Extraído da “Somma di Teologia Dogmatica” do padre Giuseppe Casali
Vários Critérios
Encontrando-nos diante do fato de haver várias religiões que se dizem reveladas e não podendo ser verdadeira senão uma só, é necessário antes de tudo examinar quais são os critérios corretos para se poder conhecer com sinais certos qual seja esta verdadeira religião.
Trataremos, por isso, em três artigos:
1 – Critérios da divina revelação em forma geral
2 – O milagre
3 – A profecia
Critérios em geral
Os critérios (do grego kritérion, julgar) da revelação, ou motivos de credibilidade, são os sinais que acompanham a Revelação e provam clarissimamente que Deus falou e que por isso a Revelação deve ser acolhida como verdadeira.
Com estes critérios se deve julgar e conhecer a verdadeira Revelação de uma revelação falsa. Tais critérios são tanto mais eficazes quanto mais coloquem em evidência a intervenção de Deus.
Por isso devemos estudar historicamente o fato da Revelação, e se encontrarmos estes sinais, poderemos ter a certeza de que esta revelação foi feita por Deus.
Tais sinais deverão estar ao alcance de todos, de modo que se possa formar uma certeza não somente em uma pessoa de ciência, mas também em uma pessoa humilde e de inteligência modesta como, por exemplo, um agricultor inculto o qual reconhece a verdade da pregação da religião e dos milagres de Jesus ensinados pela Igreja e pelos seus ministros.
Podemos dividir os critérios ou motivos de credibilidade em duas grandes categorias:
1. Critérios internos, isto é, que surgem da mesma doutrina revelada. Podem ser:
a) Universais como a satisfação maravilhosa que a doutrina dá a todas as aspirações humanas de justiça, de santidade, de felicidade; a utilidade que a doutrina leva aos indivíduos singulares, à família, à sociedade.
b) Individuais como a luz, a serenidade, o conforto, a alegria que a doutrina leva ao indivíduo, como palavra de Deus.
2. Critérios externos, isto é, que não surgem da doutrina revelada, mas são fatos maravilhosos que a acompanham. Podem ser:
a) Intrínsecos à doutrina, como o fato de que esta seja imune a erros, e cheia de belezas, de coerência, de santidade, de verdades sublimes; e
b) Extrínsecos, como a grandeza e a excelência de quem anuncia esta doutrina, os efeitos maravilhosos que produz em quem a escuta, os fatos maravilhosos que acompanham a sua manifestação, como especialmente os milagres e as profecias.
Alguns desses sinais têm força de prova se tomados juntos, enquanto que sozinhos não dariam garantia suficiente. Assim, por exemplo, se alguém pegasse apenas os critérios individuais, adotaria um critério demasiado subjetivo e insuficiente que sozinho mostraria a aspiração e a conveniência de uma Revelação, mas não o fato. Unido, ao contrário, a outros critérios, reforça a prova.
Entretanto outros critérios têm força verdadeiramente provativa como a constatação de que os efeitos produzidos por esta doutrina sejam tais para surpreender o poder de qualquer força humana e para provar a transcendência, isto é, a origem superior. No Cristianismo, por exemplo, se pode deduzir a origem divina da doutrina, dos frutos de virtude e de coragem que soube infundir nos seus seguidores.
Dentre todos esses critérios, os mais eficazes e demonstrativos são dois: o milagre e a profecia. Diz o Concílio Vaticano I que Deus quis unir com os auxílios internos do Espírito Santo os argumentos externos de sua revelação, isto é, dos fatos divinos, e os primeiros de todos os milagres e as profecias que demonstram amplamente a onipotência e a infinita ciência de Deus são os sinais certíssimos da divina revelação e adequados à inteligência de qualquer um (D. B. 1790)
Por isso falamos à parte.
O MILAGRE
Conceito de milagre
O milagre (do latim mirum = coisa maravilhosa) é um fato sensível, extraordinário, divino.
a) Fato sensível. O milagre serve na Apologética para testemunhar a intervenção divina. Por isso, é necessário que seja controlável pelos nossos sentidos. Também a coisa mais bela, se não a pudéssemos ou ver ou ouvir, ou perceber com qualquer sentido nosso, nos escaparia e não poderia nos dar nenhuma prova apologética.
São Tomás (S. Teol. III, art. 29, 1,2) distingue duas espécies de milagres: alguns escondidos, como a Transubstanciação, a Encarnação, o Parto virginal de Maria, a justificação que acontece na alma mediante a graça, etc; outros manifestos, como a ressurreição de um morto, uma tempestade acalmada, a multiplicação dos pães, etc.
Examinemos um primeiro: na Transubstanciação, isto é, na mudança de toda a substância do pão na substância do Corpo de Jesus, e de toda a substância do vinho na substância do Sangue de Jesus, tanto antes quanto depois, aos meus olhos se mostram as aparências de pão e de vinho. Não tenho um fato sensível, isto é, que se mostre aos meus sentidos.
Examinemos um segundo: no milagre operado por Jesus em Caná da Galileia (Jo 2,1-12) de mudar água em vinho, os presentes primeiro viram e podiam degustar a água, e depois viram e degustaram o vinho.
Logicamente aqui, quando falamos de milagres, queremos dizer os milagres manifestos, que, podendo ser controlados, nos dão um testemunho acessível a qualquer um.
b) Extraordinário, ou seja, absolutamente fora ou acima do modo de agir de uma coisa criada ou criável. Em outras palavras: fora ou acima das leis gerais da natureza.
Isso não significa que Deus destrua as leis da natureza, mas, com a Sua onipotência, as domina e as submete de modo a produzir um resultado acima da natureza ou diferente da lei natural. Aquelas forças existem, mas a intervenção de Deus opera sobre a ordem geral.
Apenas impropriamente se diz que o milagre é contrário às forças da natureza no sentido de que o efeito seria diferente se não fosse intervinda uma força superior.
Podemos compreender melhor com um exemplo. Se deixo de sustentar uma pedra do alto, ela cai por força da gravidade. Assim também um avião que pare e não seja sustentado por nenhuma força cai. Se, porém, uma força superior intervém naquela da gravidade, esta força superior vence aquela inferior. Assim, se lanço ao ar uma pedra, ou um avião com velocidade até quando dure esta força de propulsão superior àquela da gravidade, quer a pedra, quer o avião estão no ar. O homem mesmo com uma outra lei superior da natureza pode dominar aquela inferior. Isto, sabe-se, não é um milagre. Ao contrário, Deus não só pode com toda a facilidade dar a estas forças uma eficácia da qual normalmente são privadas, mas pode fazer privar de seu concurso e produzir com a sua potência efeitos que tais forças não poderiam nunca atingir.
Por isso, o milagre acontece por uma força superior que domina uma lei natural inferior segundo as próprias leis da natureza.
Eis o modo em que o milagre absoluto é fora da ordem. Não se deve deduzir que seja fora de toda ordem porque é, ao contrário, a expressão de uma ordem superior, fixado por toda a eternidade, segundo o qual o Onipotente dispõe ao seu talento umas forças que criou enquanto o julga útil para o bem dos seres racionais. (Cf. GIUSEPPE FALCON: Manuale di Apologetica – Ed. Paoline, Alba 1951)
c) Divino, isto é, quando validadas todas as circunstâncias se pode atribuir somente a Deus.
Deus pode agir imediatamente por Si mesmo ou mediante os anjos ou os homens ao Seu serviço, mas do exame apurado é fácil concluir se os efeitos produzidos se devam atribuir a Deus como causa principal.
Divisão
I – Segundo o grau, o milagre se divide em absoluto ou relativo.
a) O milagre absoluto, ou de primeira ordem, acontece quando sob todas as condições que expusemos.
b) O milagre relativo, ou de segunda ordem, se chama aquele que acontece quando o fato sensível é extraordinário somente porque supera as forças dos homens, mas não aquelas de ser suprassensíveis como os anjos; e é divino pelo menos em sentido lato, porque, se não é operado diretamente por Deus, há a Sua aprovação. Por exemplo, o canto dos anjos na noite de Natal, o fato da levitação de corpos de alguns santos, o caminhar sobre as águas, fatos que podem acontecer também com as forças angélicas gerais, são obra e testemunho divino; pelo qual também eles têm força demonstrativa na Apologética.
Porém para notar é necessária a aprovação formal de Deus, isto é, que operem em conformidade com a vontade expressa de Deus, já que se também os anjos maus operassem coisas impossíveis ao homem, mas possíveis às suas faculdades angelicais, Deus nos dá um modo de descobrir a sua fraude e de conhecer que não há a Sua aprovação de modo que não sejamos induzidos ao erro.
II – Segundo os diversos aspectos com o qual supera as forças criadas, São Tomás (S. T. 1, 195 a.8) divide o milagre em três espécies:
a) Pela substância mesma do fato realizado, isto é, quando o fato em si supera as forças da natureza. Assim a presença de dois corpos no mesmo lugar e espaço é um fato que a natureza criada não pode absolutamente realizar.
b) Pelo sujeito no qual o milagre é realizado. Por exemplo, a ressurreição de um morto, a cura de um cego. A natureza pode produzir a vida e a vista no sentido de que um vivente pode nascer de outro vivente, mas não no sentido de que possa dar de novo a vida a um morto.
c) Pelo modo segundo o qual é realizado o milagre. Por exemplo, a cura instantânea de uma doença que poderia ser curada com longos cuidados.
Alguns teólogos unem esta divisão a outra do próprio São Tomás (De Potentia 6, a 2 ad 3) que fala do milagre contra, acima e fora da natureza.
III – Segundo o campo no qual é operado, o milagre se divide em:
a) Físico quando é operado fora da ordem geral das leis físicas como a multiplicação dos pães, a cura instantânea dos enfermos, a incolumidade dos três jovens jogados na fornalha de fogo, etc.
b) Intelectual quando a cognição de uma coisa é dada fora das leis gerais do conhecimento. Por exemplo, a profecia, que prediz coisas futuras dependentes da vontade livre, o conhecimento dos segredos do coração, uma ciência infundida, etc.
c) Moral quando uma ação ou uma série de ações são realizadas fora das leis morais gerais de modo a não poder ser atribuídas às forças humanas apenas, sem um auxílio divino especial. Por exemplo: a constância dos mártires, a repentina conversão de um pecador como acontece a São Paulo, a maravilhosa propagação da Igreja Católica, a Sua permanência no mundo não obstante todas as perseguições, etc.
Possibilidade do Milagre
TESE – Dada a existência de Deus, o milagre não só não repugna mas é possível e muito conveniente.
É CERTO FILOSOFICAMENTE
TEOLOGICAMENTE DE FÉ
PROVA: Esta tese é contra os deterministas que julgam o milagre impossível como uma violação das leis determinadas por Deus.
a) Não repugna as leis da natureza. Deus, autor da natureza, é certamente superior às leis que criou: pode, portanto, intervir e agir dominando o efeito destas leis gerais, como dissemos. Também o homem mesmo muitas vezes pode dominar aplicando outras leis.
b) Não repugna a natureza de Deus. De fato, o milagre não é contra a imutabilidade de Deus, que estabeleceu estas leis. Deus não muda o Seu projeto e ordem determinados, mas desde a eternidade, estabelecendo a ordem natural ou sobrenatural, tinha previsto e estabelecido essas circunstâncias e esses fatos fora da ordem geral. Diz São Tomás (De Potentia VI, 1 a 6): “Deus desde a eternidade previu e quis fazer aquilo que faz no tempo. De fato, estabeleceu o curso da natureza de tal modo que na sua eterna vontade preordenou o que às vezes teria feito fora deste curso”. E em outro lugar (S. Teol. I, 19 a 7): “Mudar a vontade é uma coisa, querer que certas coisas mudem é outra. É possível querer que uma coisa seja feita agora e seu contrário depois”.
Traduzido para o Veritatis Splendor por Marcos Zamith diretamente do endereço http://christusveritas.altervista.org/teologia_dogmatica_segni_riconoscere_religione_rivelata.htm
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