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quarta-feira

O Sacramento da Eucaristia segundo a Igreja Católica pelo Côn. José Wilson, ocrl


Depois de termos estudado na matéria anterior sobre o Sacramento do Batismo, hoje, vamos conhecer mais de perto o Sacramento da Eucaristia. É ele o Sacramento que pela transubstanciação, as oferendas de pão e vinho, se tornam no verdadeiro Corpo e no verdadeiro Sangue de Jesus Cristo, real e substancialmente presente debaixo dos acidentes de pão e de vinho consagrados. Nas matérias consagradas está Jesus Cristo todo inteiro em cada uma das partes. Devemos entender que o Sacramento é consumado pela Consagração que se dá na liturgia eucarística dentro do ritual da Santa Missa, principal culto da Igreja Católica Apostólica Romana.
“Todo o batizado deve participar da Santa Missa para comungar do Sacramento da Eucaristia”. Por quê?
Se pelo batismo sou inserido no Corpo Místico de Cristo que é a Igreja, quando se participa do Culto sagrado da Igreja e se toma parte da Mesa do Senhor, esta unidade se plenifica.
Culto principal da Igreja
Na Missa ou o Sacrifício do Senhor, o povo de Deus é convocado e reunido, sob a presidência do sacerdote que representa a pessoa de Cristo, para celebrar a memória do Senhor ou sacrifício eucarístico (Mt 18, 20). Na celebração da Missa, se perpetua o sacrifício da cruz; Cristo está realmente presente tanto na assembléia reunida em seu nome, como na pessoa do ministro, na sua palavra, e também, de modo substancial e permanente, sob as espécies eucarísticas.
Para a Igreja Católica o Santo Sacrifício da Missa ou o Culto Eucarístico, não é apenas o ato principal da liturgia cristã; mas é o ato central. Assim como a luz cintilante que, encerrada numa urna de alabastro, dar relevo aos contornos do vaso, o Sacrifício, colocado no centro da Religião, como o altar no ponto de encontro de todas as linhas arquiteturais do templo, têm o mesmo valor. Por isto, todo o batizado nas salas de catequeses de Primeira Comunhão, deveria ser educado para compreender o valor da participação consciente e ativa da Santa Missa. Porque em volta do Sacrifício gravita a Oração oficial da Igreja, erguendo-se ao céu em suaves ondulações, em ascendentes espirais de louvor; desenrolam-se, num ciclo admirável, da Encarnação a Redenção de Cristo. Não é qualquer coisa que se está celebrando, mas, um Culto executado pelo mesmo Deus Filho, Jesus Cristo Nosso Senhor, que se torna oferenda e ofertado, celebrante e celebrado, servidor e servido, adorador e adorado, pedinte e doador.
Não existe e nem haverá outro meio pelo qual conseguiremos viver em plena comunhão com Deus, a não ser pelo meio do santo Sacrifício da Missa, momento especial onde somos nutridos de todas as formas para permanecermos em plena comunhão com Ele pela sua Palavra e pela Eucaristia, e, revitalizados para continuarmos a nossa caminhada aqui na terra.
No Sacrifício da Santa Missa fazemos uma oferenda do pão e do vinho, incenso e preces, frutos do trabalho humano a Deus, uma vez oferecida, a coisa cessa de pertencer ao homem; e o instinto do homem não tarda em descobrir-lo. É a inutilização da oferta – cremação duma substância sólida, efusão dum líquido, morte e ressurreição de um Cordeiro (Jesus Cristo – o Cordeiro de Deus).

Diferença entre o Sacrifício da Missa e um Culto pagão
Para não confundirmos as coisas, existe uma diferença entre o Santo Sacrifício da Missa e um sacrifício pagão. Qual?
ü  No culto pagão a oferenda é doada a um deus falso e inútil;
ü  O animal sacrificado é destruído para satisfazer um sentimento humano de satisfação; não existe uma doação (um retorno imediato) do sacrifício oferecido a o que está sacrificando.
Exemplo: quando se mata um animal, ele ou é consumido pelo fogo ou é deixado para que aconteça uma decomposição natural da matéria.
ü  Na Missa isso não ocorre assim. A oferta é oferecida ao Deus verdadeiro e Poderoso, e, devolvida ao homem santificada por Ele mesmo. O Deus Vivo é o principal objeto de Culto. Nós falamos com Ele e Ele fala conosco, nós nos doamos a Ele e ele se doa a nós.
De uma forma simples, não há mais um animal oferecido a Deus, como nos cultos pagãos de hoje para ser sacrificado, mas, o próprio Deus Filho faz as vezes do cordeiro, onde ele se torna Sacerdote, Altar e Cordeiro. Repito, a Santa Missa é o ato principal de toda liturgia, onde tudo converge a Deus, Princípio e Fim de todas as coisas, visíveis e invisíveis.
Sacramento da Eucaristia, Corpo de Cristo
Enfim, o Sacramento da Eucaristia, então, não é uma representação, recordação ou simbologia da Paixão e Morte do Redentor, mas uma real e verdadeira atualização do Sacrifício que foi feito no Calvário com o Corpo de Jesus Cristo. Podemos verdadeiramente dizer que o nosso Divino Salvador, em cada Missa a ser celebrada, misticamente renova sua Morte e Ressurreição por cada um de nós. Doa-se repetidas vezes para fortalecer, alimentar e criar no batizado a Vida de Deus.
Demos graças a Deus porque Ele nos dar permissão de nos envolvermos, de uma forma especial, no Mistério que se realiza sobre o altar, onde realmente renovado, ainda que de incruento, o mesmo Sacrifício que foi feito na Cruz com derramamento de sangue. O mesmo organismo, o mesmo sangue, o próprio Jesus foi oferecido no Calvário e nos é oferecido do mesmo modo na Santa Missa.
Sacramento da Eucaristia (Dogma de Fé)
O que a Igreja Católica ensina acerca deste Sacrifício, como dogma de fé, foi por ela tirado das palavras de Nosso Senhor, quando naquela última noite confiou aos Apóstolos os próprios Mistérios Sagrados, e lhes disse: “Fazei isto em Minha memória” (Lc 22, 19; I Cor 11, 24). Uma prova bastante clara desse fato está nas palavras que o Apóstolo escreveu aos Coríntios: “Não podeis, diz ele, beber o Cálice do Senhor e o cálice dos demônios; não podeis tomar parte na Mesa do Senhor e na mesa dos demônios” (I Cor X, 20ss). Ora, se por “mesa dos demônios” devemos entender o altar em que lhes eram oferecidos sacrifícios, a “Mesa do Senhor” não pode significar outra coisa, senão o altar em que se sacrificava ao Senhor. Só nesse sentido é que as palavras do Apóstolo têm sua força de argumentação.
Está na Eucaristia o mesmo Jesus Cristo que está no Céu e que nasceu, na terra, da Santíssima Virgem Maria. Por que acreditamos que no Sacramento da Eucaristia está verdadeiramente Jesus Cristo? Porque Ele mesmo o disse, e assim no-lo ensina a Santa Igreja durante toda a sua existência.
A Eucaristia no Catecismo de São Pio X
Antes do atual Catecismo da Igreja Católica de João Paulo II, o catecismo que orientava a Igreja era o de São Pio X, feito de perguntas e respostas. Ele era muito rico em conteúdo, só que havia um problema. Qual? As respostas para as perguntas tinham todo um fundamento, mas não sabíamos de onde eram tiradas, quer dizer, não sabíamos aonde estavam as fontes que orientavam as respostas. Esta necessidade foi suprida com o novo Catecismo de João Paulo II. Nele está nas notas de roda pé, todas as bases, bibliografias e etc. para irmos mais além, daquilo que ali está apresentado. Vejamos o que nos diz o Catecismo de S. Pio X sobre o Sacramento da Eucaristia:
Das disposições necessárias para bem comungar
625) Produz o Sacramento da Eucaristia sempre em nós os seus maravilhosos efeitos?
O Sacramento da Eucaristia produz em nós os seus maravilhosos efeitos, quando o recebemos com as devidas disposições.
626) Quantas coisas são necessárias para fazer uma comunhão bem feita?
Para fazer uma comunhão bem feita, são necessárias três coisas:
1º estar em estado de graça;
2º estar em jejum desde uma hora antes da comunhão;
3º saber o que se vai receber e aproximar-se da sagrada Comunhão com devoção.
627) Que quer dizer: estar em estado de graça?
Estar em estado de graça quer dizer: ter a consciência limpa de todo o pecado mortal.
628) Que deve fazer antes de comungar quem sabe que está em pecado mortal?
Quem sabe que está em pecado mortal, deve fazer uma boa confissão antes de comungar; porque para quem está em pecado mortal, não basta o ato de contrição perfeita, sem a confissão, para fazer uma comunhão bem feita;
629) Por que não basta o ato de contrição perfeita, a quem sabe que está em pecado mortal, para poder comungar?
Porque a Igreja ordenou, em sinal de respeito a este Sacramento, que quem é culpado de pecado mortal, não ouse receber a Comunhão, sem primeiro se confessar.
630) Quem comungasse em pecado mortal, receberia a Jesus Cristo?
Quem comungasse em pecado mortal, receberia a Jesus Cristo, mas não a sua graça; pelo contrário, cometeria sacrilégio e incorreria na sentença de condenação.
631) Em que consiste o jejum eucarístico?
O jejum eucarístico consiste em abster-se de qualquer espécie de comida ou bebida, exceto a água natural, que, na atual disciplina eucarística, não quebra o jejum.
632) Pode comungar quem engoliu restos de comida presos aos dentes?
Quem engoliu restos de comida presos aos dentes, pode comungar, porque já não são tomados como alimentos ou perderam tal condição.
633)  Quem não está em jejum, pode comungar alguma vez?
Comungar sem estar em jejum é permitido aos doentes que estão em perigo de morte, e aos que obti prolongada. A comunhão feita pelos doentes em perigo de morte chama-se Viático, porque os sustenta na viagem que eles fazem desta vida à eternidade.
634) Que querem dizer as palavras: saber o que se vai receber?
Saber o que se vai receber quer dizer: conhecer o que ensina com respeito a este Sacramento a Doutrina Cristã e acreditá-lo firmemente.
635) Que quer dizer: comungar com devoção?
Comungar com devoção quer dizer: aproximar-se da sagrada Comunhão com humildade e modéstia, tanto na própria pessoa como no vestir, e fazer a preparação antes e a ação de graças depois da Comunhão.
636) Em que consiste a preparação antes da Comunhão?
A preparação antes da Comunhão consiste em nos entretermos algum tempo a considerar quem é Aquele que vamos receber e quem somos nós; e em fazer atos de fé, de esperança, de caridade, de contrição, de adoração, de humildade e de desejo de receber a Jesus Cristo.
637) Em que consiste a ação de graças depois da Comunhão?
A ação de graças depois da Comunhão consiste em nos conservarmos recolhidos a honrar a presença do Senhor dentro de nós mesmos, renovando os atos de fé, de esperança, de caridade, de adoração, de agradecimento, de oferecimento e de súplica, pedindo sobretudo aquelas graças que são mais necessárias para nós e para aqueles por quem somos obrigados a orar.
638) Que se deve fazer no dia da Comunhão?
No dia da Comunhão deve-se manter, o mais possível, o recolhimento, ocupar-se em obras de piedade, bem como cumprir com grande esmero os deveres de estado.
639) Depois da sagrada Comunhão, quanto tempo permanece Jesus Cristo em nós?
Depois da sagrada Comunhão, Jesus Cristo permanece em nós com a sua graça enquanto se não peca mortalmente; e com a sua presença real permanece em nós enquanto se não consomem as espécies sacramentais.
Conclusão
Ao chegar a conclusão de nossa breve reflexão sobre este Sacramento adorável, posso dizer que nenhuma palavra escrita aqui pode nomear o que é o Santo Mistério do Corpo e Sangue de Jesus Cristo presente sob os véus do pão e vinho consagrados. O que precisamos é redescobrir o valor real e verdadeiro desse Dom de Deus doado a sua Igreja. Que neste ano da fé, procuremos aprofundar o nosso conhecimento através dos estudos e no contado pessoal com o Senhor na Eucaristia presente em todos os sacrários da terra.

Autor: Cônego José Wilson Fabrício da Silva, ocrl

terça-feira

PADRE CÍCERO E A FÉ DO POVO


1. Juazeiro como lugar privilegiado da religião popular.
Juazeiro do Norte é um caso único. A religião popular desenvolveu-se em Juazeiro de modo independente do clero. A política eclesiástica desde a Separação  da Igreja e do Estado consistiu em entregar os lugares de romaria a congregações religiosas. Isto não aconteceu em Juazeiro por razões óbvias A romaria a Juazeiro foi condenada pela Igreja e o clero sempre manifestou a maior hostilidade ao que acontecia em Juazeiro. A condenação de padre Cícero trazia consigo a condenação da romaria Com isso não houve interferência do clero.
A romaria a Juazeiro nunca manifestou fenômenos de heresia ou de cisma. Todos os romeiros sempre foram bons católicos, respeitaram a autoridade religiosa, mas desconheciam as sutilezas do direito canônico. O fato de não estar sob o controle de padres o de religiosos não prejudicou em nada a fidelidade a Igreja católica.
É verdade que não puderam receber os sacramentos tantas vezes como teria sido se a romaria estivesse nas mãos de uma congregação. Mas para as massas populares os sacramentos são atos de devoção parecidos com outros e da mesma eficácia. Eles não estudaram o tratado De gratia. A limitada possibilidade de receber os sacramentos tem pouca repercussão na fé deles. Os sacramentos pertencem mais ao ritual das Santas Missões.
Com certeza, nem todos os romeiros viviam como santos. No meio deles havia de tudo, e ainda há de tudo.  São o reflexo da sociedade nordestina. Entre eles podem encontrar-se todos os vícios característicos da cristandade: embriaguez, violência, luxuria vagabundagem, etc. Mas os que seguiam Jesus nas suas andanças eram assim. Não eram os fiéis observantes da lei, os devotos do templo. Havia de tudo. Jesus não selecionou e até afirmou que haveria prostitutas e ladrões no reino de Deus mais adiante do que os fariseus, perfeitos observantes de todas as leis. Precisamos justamente evitar todo tipo de seleção moral, para ser fiéis a Jesus e não semelhantes aos fariseus. Se tivesse havido mais sacerdotes, eles teriam falado contra os pecadores. Mas não convém que os sacerdotes se transformem em policiais, sobretudo numa romaria que é sinal de esperança e de acolhida para todos.
Houve sociólogos que acharam em Juazeiro fenômenos de messianismo. Mas algo semelhante foi muito divulgado em toda a Igreja católica no Brasil quando nasceu a República. A República proclamou a separação da Igreja e do Estado. Muitos acharam que era um sinal do fim do mundo. Também o próprio padre Cícero pensava o mesmo, assim como muitos dos seus colegas. Mas, depois de alguns anos, todos se acostumaram a República e nada aconteceu. Todo o messianismo desapareceu e ninguém mais entre os católicos anunciou o fim do mundo como iminente.
Alguns sociólogos denunciaram também os milagres. De fato, o povo acredita em milagres e sente a presença de Deus na sua vida por meio de muitos milagres. Aliás, essa crença ainda persevera em pessoas que já passaram pela escolarização, inclusive entre muitos intelectuais.
Porém, a crença nos milagres faz parte da herança católica. O próprio Vaticano exige milagres para a beatificação ou a canonização.  A crença nos milagres forma parte da tradição católica e não constitui nenhuma anomalia dos romeiros de padre Cícero. Essa crença é tão forte no povo, que os próprios neo-pentecostais fazem muitos milagres; porque sabem que é o que povo espera.
A romaria de Juazeiro permite que observemos o que é a religião popular em estado quase puro, o que nos permite compreender melhor essa religião e apreciá-la. Uma das lições é esta: a grande distância entre a religião realmente vivida pelo povo simples e a religião oficial pregada pelo clero. É verdade que, no passado pelo menos, e ainda hoje em parte, o próprio clero está dividido entre duas religiões: há a religião que os padres ensinam porque é a profissão deles, e a religião que praticam na sua própria vida e que pode ser parecida com a religião popular que aprenderam na família. A fé dos padres expressa mais o que a sua mãe lhes ensinou do que a teologia que  aprenderam no seminário. Mas evidentemente eles sabiam que Juazeiro era lugar proibido e não quiseram desobedecer.

2. O que representa padre Cícero


Padre Cícero é uma presença do sagrado. O sagrado, isto é, a força de vida que fundou o mundo e o dirige e pode estar identificada na natureza, no céu, no sol, na lua, nas estrelas, na terra, em plantas, em animais, ou em seres humanos    ( reis, profetas, sacerdotes, sábios). Mas o sagrado pode estar somente num Deus único como no caso de um monoteísmo rígido, como no judaísmo. Dessa tradição nasceram as religiões cristã e muçulmana. No entanto no próprio judaísmo certas pessoas humanas foram tratadas como reflexo de Deus, por exemplo, os profetas. No próprio Islã o fundador, Maomé recebe um culto especial.
Sabemos que no Novo Testamento todos os seres humanos são sagrados porque o Espírito está em todos. Mas isto não é conhecido e constitui uma novidade tão grande que somente uma revelação pode dá-lo a conhecer.
A mensagem evangélica é pouco conhecida e não era assunto a ser tratado nas Santas Missões. A antiga tradição da humanidade revive no cristianismo na forma de veneração dos Santos. Estes são pessoas excepcionalmente sagradas, que são como uma presença de Deus. No passado foram os mártires, e depois certos monges, missionários, bispos que o povo canonizou.
Com o decorrer dos tempos a própria instituição católica reconheceu os Santos, e veio o momento em que o Papa se reservou a capacidade e o direito de proclamar os Santos,  o que parece uma pouco abusivo. Pois, dessa maneira, entram nas canonizações motivações políticas, inclusive de política eclesiástica.. A canonização torna-se instrumento de poder. Apesar disso , há Santos não incluídos na lista oficial, mas  que o povo reconhece como Santos , por exemplo dom Oscar Romero. Entre eles está padre Cícero de Juazeiro.
Claro está que Deus é o sagrado absoluto e total. Está presente em tudo. Mas essa universalidade é também uma limitação para a humanidade. Com ela, Deus se torna muito distante. Ele se aproxima, manifestando a sua presença de modo mais concreto em realidades de experiência imediata : entidades materiais, animais, ou seres humanos. Jesus é a própria revelação de Deus, mas ele também já é tão universal que precisa de presenças mais imediatas. Todas as religiões têm esses entes intermediários entre Deus e os seres humanos: são os orixás, os anjos e, para os cristãos, os Santos de modo privilegiado. Os Santos muitas vezes já são Santos quando ainda vivem nesta terra. Há Santos que, ainda estando na terra, fazem milagres.
Os Santos cristãos têm algumas características que lhes são próprias. Pois, eles representam um Deus diferente. O Deus de Jesus não é um deus temível, que domina pelo seu poder, que é exigente, que exige um culto, sacrifícios, obediência a preceitos rigorosos. O Deus de Jesus é justiça para os oprimidos, perdão para os pecadores, compaixão pelos doentes e todos os excluídos, condenação para os opressores, e não pede nada para si mesmo porque não precisa de nada.
Por isso, os Santos cristãos são diferentes. Pois, eles refletem o rosto do Deus de Jesus. Fazem transparecer de maneira mais clara esse Deus. Eles querem a justiça para com os pobres e podem enfrentar por isso a perseguição e até a morte. São compassivos para com os doentes, os humilhados, os perseguidos. São acolhedores para os pecadores, duros com os opressores. São solidários com os pobres.
Além disso, os Santos são também presença de Deus porque fazem milagres. Manifestam que o poder de Deus é para aliviar os sofrimentos, para curar os doentes, para defender os oprimidos. Deus nada quer para si mesmo. Não precisa de nada e não quer nada para si mesmo. Quer apenas expressar a sua justiça parta com os pobres e a compaixão por todos os que sofrem.
Os Santos não são rivais de Deus, como às vezes pensaram os Reformados. Não atraem o culto para si próprios. O que o povo procura e descobre neles, não são as pessoas deles, mas o rosto de Deus. O culto dirige-se a Deus de quem eles são a presença transparente.
Se um cristão busca prestígio, honras, promoção, não poderá ser Santo, nem fará milagres. O Santo é completamente desinteressado, como um servidor de Deus que o deixa transparecer nos seus atos e nas suas palavras. Se uma pessoa mostra que busca um interesse próprio, jamais o povo o reconhecerá como Santo.
Por isso, pode haver muita ambigüidade nas espiritualidades que estimulam o desejo de ser Santo: “quero ser Santo!”. O que significa isso realmente na psicologia da pessoa? Há pessoas muito religiosas, mas tão rígidas que ninguém as reconhece como Santos, apesar de que praticam heroicamente todos os atos devocionais que apareceram na história da Igreja.
Ora, os caracteres dos Santos são justamente o que os romeiros descobrem em padre Cícero. Para os romeiros ele é uma transparência de Deus, uma manifestação visível e muito próxima deles. Juazeiro é lugar sagrado por ali está padre Cícero.
Padre Cícero é acolhedor, acolhe os pecadores, os fracos, Atende aos doentes, Tem compaixão pela vida dos pobres e os sofrimentos deles. É bom sublinhar essas virtudes cristãs, quando se fala de padre Cícero.
Pode ser que padre Cícero chegue a ser canonizado. Muito bem! Padre Cícero não ganhará nada com isso e também os romeiros não vão ganhar nada. Quem vai ganhar com isso será o próprio Papa. O Papa vai mostrar o seu poder e vai ganhar a estima dos romeiros porque, por fim, descobriu o que eles já sabiam, que padre Cícero é Santo, e não era necessário que alguém o dissesse. Se for canonizado, todo o mundo vai alegrar-se porque agora o Papa se junta a nós para venerar padre Cícero.
Os romeiros voltam para casa com mais fé e esperança, com mais coragem e mais confiança para enfrentar a dura vida de cada dia. Entrou neles uma nova força, e, por isso, no próximo ano, irão de novo para a fonte de vida, porque a luta nesta terra é de muitos sofrimentos, e como suportar essa vida? O Santo ajuda. Ele faz milagres e o primeiro milagre é a fé e a esperança do povo dos romeiros.
Todos levam lembranças, imagens, santinhos, imagens de gesso, folhetos, que são dentro das suas casas uma presença de Juazeiro. Dom Helder ainda conheceu padre Cícero no final da vida dele e ficou muito edificado. Contava que um dia entrou da casa de taipa de uma pobre velhinha Dentro da casa viu que havia 4 santinhos de padre Cícero nas paredes. Então  dom Helder disse a mulher “Estou vendo que a senhora gosta muito de padre Cícero.”   A velhinha respondeu : “Gosto muito, sim senhor.” E dom Helder perguntou : “Porque a senhora gosta tanto de padre Cícero ?” A mulher disse : “Olha, dom Heldi, eu vou dizer porque é o senhor que pergunta.  O padre Cícero é o próprio Sagrado Coração de Jesus”.
Nessa resposta estava tudo dito. Jesus ainda está longe e precisa aparecer em figuras humanas. Padre Cícero era justamente essa transparência de Jesus, ou seja, de Deus.
Os historiadores podem contestar a santidade de padre Cícero por causa da atividade política dele, por causa das suas relações com caciques locais e por causa do dinheiro que recebia. Mas tudo ia aos pobres. Tudo o que ele deixou aos salesianos no seu testamento era, na idéia dele, um serviço aos pobres, porque os salesianos estavam a serviço dos pobres.
De qualquer maneira, o povo não se interessa muito por isso. Sabia e sabe que padre Cícero vivia a serviço dos pobres e era isso o que importava. Os critérios dos pobres não são os critérios dos historiadores que não vivem a vida dos pobres.

3. O futuro de Juazeiro


Juazeiro está ligado a pobreza do Nordeste. Os romeiros são os pobres do Nordeste, basicamente os que moram em cima do rio São Francisco desde Alagoas até o Ceará. Há duas categorias: os trabalhadores da cana na zona da mata, e os pobres agricultores ou artesãos do sertão ou do agreste.
 Se desaparecesse a pobreza, o que aconteceria? Com certeza tudo mudaria. Os romeiros tradicionais deixariam de existir. Os seus filhos poderiam continuar um pouco, pelo menos alguns deles. Mas não viriam como os pobres que pedem ajuda a padre Cícero. A romaria poderia continuar, mas ela mudaria. Uma população mais rica daria um aspeto mais urbanizado aos lugares de culto. Haveria imensos estacionamentos para carros e viriam ônibus de luxo. Eventualmente teriam que aumentar o aeroporto. Já que a doença não  acabaria, ainda poderiam vir muitas pessoas pedindo a cura, assim como em Lourdes e Fátima.
O que fazer nesse caso? Juazeiro poderia ser um centro de retiros espirituais ou de estudos da religião. Todos desejamos que acabe a pobreza no Nordeste. Infelizmente as políticas dos governos sucessivos não permitem prever que a pobreza será suprimida em breve. Enquanto isso não acontece e ainda aparecem em Juazeiro multidões de pobres, é melhor evitar introduzir atividades que seriam de classe media.
Também se fizesse agora, quando ainda há multidões de pobres, não seria muito interessante promover instituições próprias da classe média porque as pessoas que viriam já não seriam mais os pobres, porque os burgueses introduziriam temas e formas de cultura burguesa, perturbando a religião dos pobres. A cultura burguesa invade todos os espaços e expulsa os pobres.
Neste momento é preciso fazer todo o possível par evitar a entrada de movimentos burgueses, porque assumiriam a direção de tudo. Os burgueses são inconscientes. Quando pessoas do mundo popular e pessoas da classe média se encontram, a classe média sempre se impõe. Por enquanto, é preciso preservar o caráter popular de tal modo que os pobres se sintam a vontade. Os pobres não têm tantos lugares que sejam deles!
Outro perigo é que a romaria poderia transformar-se num lugar turístico. Assim aconteceu com as romarias na Terra Santa, e muitos outros lugares ou em Roma, mesmo em Assis, e em muitos outros lugares da Europa ou da Ásia. Ainda haveria alguns fiéis que iriam a Juazeiro com mentalidade de romeiros, para manter uma tradição religiosa. Mas eles não poderiam conservar o ambiente.
O que os turistas poderiam pedir a padre Cícero? Iriam por curiosidade, para tirar fotos ou fazer um DVD. Iriam visitar Juazeiro para ver como no jardim zoológico uma espécie em via de desaparecimento: os romeiros nordestinos. Hoje em dia com o crescimento mundial do turismo é preciso inventar novos lugares turísticos e a religião é um bom negócio para o turismo. Os ricos pagam muito para conhecer os monges budistas na Tailândia. Quantos vão ao Oriente visitar santuários hinduístas ou vestígios das religiões antigas, visitam sem nenhum sentimento religioso. Dizem que, a cada ano, 50 milhões de turistas visitam a catedral de Paris. Nenhum deles vai para rezar. 
Com certeza, os comerciantes de Juazeiro estariam encantados se Juazeiro se transformasse num lugar turístico. Os turistas gastariam mais do que os romeiros. Mas é preciso resistir a todas as pressões e impedir as incursões de agências de turismo, Precisa evitar qualquer publicidade sobre Juazeiro. Os pobres não precisam de publicidade. Quem aproveitaria seriam as agências de turismo.

4. Juazeiro e a pastoral

Atualmente, o perigo mais imediato é a campanha organizada pela Igreja Universal do Reino de Deus. Eles mandam pessoas para afastar os pobres do padre Cícero. Condenam as romarias como atos de idolatria, entregam folhetos, conversam, espiam os ônibus que chegam. Muitos romeiros são surpreendidos e não sabem como reagir. Com certeza, não podemos criar um ambiente de pânico com uma contrapropaganda muito barulhenta. Mas poderia haver pessoas preparadas para interpelar esses evangélicos que atrapalham para que desanimem e desistam de realizar essa forma de apostolado.
Os evangélicos acusam os católicos de substituir Jesus por padre Cícero. Os católicos, dizem, colocam Padre Cícero no lugar de Jesus. Esta acusação é capaz de perturbar muita gente. Pode ser conveniente afirmar mais a presença de Jesus nos lugares santos de Juazeiro. Poderia ser com cartazes dizendo: “Jesus está aqui!”. Ou poderiam espalhar cartazes com palavras de Jesus no evangelho. Por exemplo, “Jesus diz: Felizes os pobres porque o Reino de Deus é deles!”. Mostrar mais a fé de padre Cícero em Jesus e como padre Cícero anunciou Jesus e dedicou a sua vida a Jesus. A Igreja universal é realmente um perigo porque sabe comunicar com os pobres.
A tradição Católica no Nordeste foi marcada, sobretudo pelas Santas Missões dos Capuchinos e dos Redentoristas. As missões tinham por finalidade a conversão moral. As missões lutavam contra os pecados profundamente enraizados na sociedade nordestina. Naquele tempo até os grandes pecadores estavam presentes nas Santas Missões. Parece que as Santas Missões de hoje mudaram um pouco. Em todo caso uma romaria é diferente de uma Santa Missão.
Em Juazeiro o centro da pregação é naturalmente o próprio padre Cícero. Não precisa insistir demais nos milagres, porque isso todos sabem. Mas insistir nas virtudes evangélicas de padre Cícero. A mensagem do evangelho não é muito conhecida. Aqui há uma oportunidade para insistir nela. As virtudes de padre são as virtudes de Jesus. Jesus perdoa, Jesus prega a não violência, e vive no meio dos pobres. Tem compaixão pelos doentes e os sofredores. Padre Cícero era assim.
É bom multiplicar e distribuir santinhos com textos que mostram a semelhança entre o evangelho e a vida de padre Cícero, e como padre Cícero foi o discípulo que Jesus queria. Juazeiro e a sua romaria ainda têm muito futuro se não perdem o seu caráter popular. A Igreja católica atual está muito integrada na cultura ocidental que é de classe média. Aí está o perigo. Quem não é pobre e visita Juazeiro, que esconda a sua própria cultura para não mudar o ambiente!

O valor teológico do Batismo para a Igreja Católica


A nossa fé ensina que os Sacramentos são necessários para a nossa salvação. Claro, o nosso único e suficiente salvador é Jesus Cristo! Mas, foi ele mesmo que por amor instituiu os Sacramentos da Igreja Católica. Todos são importantíssimos, porem os mais necessários para nossa salvação, são dois: o Batismo que recebemos uma só vez (Ef 4, 5) e a Penitência que podemos receber quantas vezes forem precisos; o Batismo (Mt 28, 19) é necessário absolutamente para todos, e a Penitência (Jo 20, 23) é necessária para aqueles que pecaram mortalmente depois do Batismo. A primeira coisa que devemos ter consciência é que o Batismo nos dá a honra de sermos injetados no Corpo Místico da Igreja como membros vivos de Jesus Cristo Ressuscitado.


O que é o Sacramento do Batismo?

O Batismo é o Sacramento pelo qual renascemos para a graça de Deus, e nos tornamos cristãos. Ele confere a primeira graça santificante no ser humano, que apaga o pecado original e também o atual, se o há; perdoa toda a pena que a ele está devida; imprime o caráter de cristão; faz-nos filhos de Deus, membros da Igreja e herdeiros do Paraíso; torna-nos capazes de receber os outros Sacramentos. Há uma obrigação para quem recebe o batismo? Sim! Qual? Quem recebe o Batismo, fica obrigado a professar sempre a fé e a observar a lei de Jesus Cristo e da sua Igreja.

“Na celebração litúrgica do Batismo, O Espírito Santo imerge os catecúmenos na morte e ressurreição de Jesus Cristo, que dá vida nova (Jo 3, 3-5; Rm 6, 4), e os envia a viver de modo tal que Jesus seja conhecido como a encarnação pessoal e histórica de justiça humana como divina”. (Rosato, pág. 57)

Símbolos usados no Ritual do Batismo

No ritual do Batismo a Igreja usa de matérias que são indispensáveis para que este sacramento seja conferido ao batizando. Usam-se de alguns símbolos que entendemos como uma linguagem original de fato do mistério, ou seja, a comunicação do mistério. Os Símbolos na Liturgia contém, ocultam, e ao mesmo tempo revelam e comunicam o mistério. Por isso dizemos que na Liturgia todos os Sinais são Sinais Simbólicos, e serão Sinais Litúrgicos na medida em que forem capazes de ocultar, conter, revelar e comunicar os mistérios de Cristo.
No Batismo o símbolo batismal mais importante é a água.  As Sagradas Escrituras nos diz que antes da criação plena do mundo o Espírito de Deus pairava sobre as águas, das quais emergiam a terra. À semelhança do que aconteceu na criação, das águas do Batismo santificadas pelo Espírito Santo emerge uma nova criatura. A Mãe Igreja, pela água do Batismo, fecundada pelo Espírito Santo, dá à luz a novos filhos. Jesus fala deste novo nascimento no diálogo com Nicodemos (Jo 3, 1-13). Também a imagem do dilúvio e do Mar Vermelho confere outro significado à água do Batismo: a água destrói, mata, mas ao mesmo tempo é meio de salvação. Como as águas do dilúvio submergiram um mundo pecador, e as águas do Mar Vermelho afogaram a cavalaria do Faraó que perseguia o povo que fugia da escravidão, assim também as águas batismais destroem o pecado, afogam o inimigo, exterminam e cancela o mal e seu veneno original.
A destruição das cadeias do mal que acontece no batismo, por sua vez é via para a libertação. No dilúvio foram poupados os justos; e das águas do Mar Vermelho saiu um povo livre e em festa. Da mesma forma, das águas do Batismo sai uma pessoa purificada das culpas, libertada da escravidão do pecado e do demônio (terá as tentações do maligno como todas as criaturas, mas não será escravo de satanás). Assim, a água é apenas um Símbolo. Ela não tem a força e nem o poder de purificar o pecado. É o Espírito Santo que foi invocado sobre ela na hora da benção, que nela atua em todos os acontecimentos e no momento do santo batismo, Ele, com a sua força e o seu poder Divino destrói todo o mal que existe e proporciona a alegria de uma nova vida.

“O Batismo é o mais belo e magnífico dos dons de Deus [...] Chamamos-lhe dom, graça, unção, iluminação, veste de incorruptibilidade, banho de regeneração, selo e tudo o que há de mais precioso. Dom, porque é conferido àqueles que não trazem nada: graça, porque é dado mesmo aos culpados: batismo, porque o pecado é sepultado nas águas; unção, porque é sagrado e régio (como aqueles que são ungidos); iluminação, porque é luz irradiante; veste, porque cobre a nossa vergonha; banho, porque lava; selo, porque nos guarda e é sinal do Senhorio de Deus” (C.I.C. nº 1216)

Recebemos também no rito do Batismo o sinal da Cruz. Os pais e padrinhos no início da celebração, pedem a Igreja o batismo para o batizando. O sacerdote acolhe a pessoa que será o novo membro da Igreja com o sinal da Cruz, traçando-a, juntamente com os interessados pelo batismo do batizando o sinal da Cruz em sua fronte. Este gesto tem grande significação. Ele quer exprimir o primeiro encontro da criança com a fé em Jesus Cristo e na Salvação pela morte redentora do Senhor na Cruz. Porque foi pela morte Dele que nos reconciliamos com o Pai Eterno e fomos inseridos na amizade da Santíssima Trindade. O Sinal da Cruz relembra esta verdade histórica e nos acompanhará até os últimos momentos de nossa existência humana.
Todos com atenção escuta a Palavra de Deus que será proclamada e explicada. Será ela que iluminará como a verdade revelada os candidatos ao batismo e a assembléia batizada, suscitando uma resposta de fé. Como o Batismo significa libertação do pecado e do demônio, após a explicação da Palavra, participamos do rito de Unção no Batismo.
A primeira unção é feita antes da infusão da água, durante as preces após a Liturgia da Palavra. É a Unção com óleo chamado dos Catecúmenos. O sacerdote unge o peito da criança, dizendo: “O Cristo Salvador te dê sua força. Que ela penetre em tua vida como este óleo em teu peito”. A partir desse momento o batizando é posse (propriedade) de Deus.
Após a unção, todos os presentes fazem a renúncia a Satanás e renovam as promessas do batismo que um dia receberam. Após este momento os padrinhos levam o batizando à pia batismal para receberem o banho da água. Agora sim, o batizando é batizado, novo povo de Deus!
Na parte final do Batizado é feita a segunda Unção com Óleo do Crisma. No Antigo Testamento era comum ungir os sacerdotes, reis e profetas. Também Cristo foi ungido pelo Espírito Santo de um modo muito especial. Então esta Unção quer significar que pelo Batismo nos tornamos participantes do poder messiânico de Jesus. E também, conforme a primeira epístola de São Pedro (2, 9-10) nos tornamos raça eleita com Cristo, reis (rainhas), sacerdotes (sacerdotisas) e profetas (profetisas). Profetas, porque participantes da salvação em Cristo, deveremos anunciar a humanidade por palavras e exemplos de vida. Mostrar que Deus é Amor através do verdadeiro amor pessoal. Tornamo-nos sacerdotes. Somos  participantes do sacerdócio de Jesus, como novo povo de Deus na Nova Aliança, sendo assim, parte de um povo sacerdotal capaz de oferecer sacrifícios com Cristo.
Terminada a unção, somos introduzidos nos gestos complementares do Batismo com a entrega da veste branca ao batizado. Este gesto tem sua origem no Batismo dos Adultos na Igreja primitiva. Ao chegarem à fonte, antes de descerem à água, as pessoas se despiam de suas vestes e eram ungidas. Após professarem sua fé e serem batizadas na piscina, saíam da água e eram revestidas de uma veste branca, simbolizando uma vida nova, despidos de seus pecados e paixões, tornando-se uma criatura nova em Cristo.
A veste branca quer expressar que por este sacramento entramos numa nova vida e esperamos levar esta nova vida até a participação do banquete celestial, onde o Senhor nos quer encontrar com a veste nupcial da amizade de Deus.
Outro gesto que temos no rito complementar é a recepção da vela acesa. Este é um gesto muito significativo. O celebrante convida os Pais a acenderem no Círio Pascal a vela da sua criança e ele reza a oração: “Pais e Padrinhos, esta luz vos é entregue para que a alimenteis. Por isso, esforçai-vos para que esta criança caminhe na vida iluminada por Cristo, como filho da luz. Perseverando na fé, possa com todos os santos ir ao encontro do Senhor, quando Ele vier. Recebei a luz de Cristo!” Pelo Batismo somos iluminados, participamos da Luz que é Cristo. Não mais andamos nas trevas, pois somos filhos de Deus. A vela acesa pode significar também a nossa fé. Ela mantendo-se acesa mostra que não caminhamos nas trevas do inimigo. Os Pais se tornam responsáveis para que a criança se torne luz para os outros em sua vida.

O Batismo na Igreja Católica desde o século I

É maravilhoso saber que o Sacramento do Batismo na Igreja Católica é administrado desde o dia de Pentecostes à aqueles que creem em Jesus Cristo (Ato 2, 37-41), e é necessário para a salvação, para aqueles aos quais o Evangelho foi anunciado e que tiveram a possibilidade de pedir este sacramento.

Os autores neotestamentários não nos oferecem “informações exatas” a respeito daquilo que passaria a se chamar de iniciação à vida cristã. Todavia, “analisando o conjunto dos textos disponíveis, pode-se reconstruir com certa aproximação a sequência das ações”. Inicialmente se dá o anúncio da Boa-Nova centrada na história da salvação, interpretada pela luz dos acontecimentos centrais de Cristo (cf. At 2, 14-36 etc.). Pela fé, os ouvintes acolhem a Palavra divina, o que inclui a metanóia, mudança de mentalidade e de vida. Há sem dúvida em seguida um aprofundamento dos conteúdos centrais da proposta cristã. Espera-se da pessoa uma clara confissão de Jesus como Cristo, Salvador e Senhor. O Batismo (Rm 6), a imposição das mãos posterior (At 8, 17-20; 19, 6) e a participação na eucaristia (At 16, 34) acompanham este itinerário. (Revista pág. 448)

 Reconhecemos o itinerário da iniciação cristã vivido de uma forma bem natural por cada batizado no início da história da Igreja católica no séc. I e II, como um processo necessário para um aprofundamento no conhecimento da pessoa de Jesus Cristo. Com o passar do tempo, a Mãe Igreja aprofunda, sistematiza e fixa o valor teológico de cada sacramento, dando como tesouro da fé a todos aqueles que querem abraçar a vida de Deus.
O mais importante é sabermos que desde o início da Igreja, nunca se excluiu as crianças da graça de Deus.

Todavia, os cristãos não pretenderão excluir as crianças da participação neste processo, sobretudo ao tomar consciência da necessidade da graça retentora de Cristo para nossa salvação e da significativa presença de crianças no ministério de Jesus. (Revista pág. 449)

No Novo Testamento encontramos algumas passagens bíblicas com certas citações afirmando que os Apóstolos ministravam o batismo à algumas famílias cristãs. Coloco isto como base para entendermos o motivo de a Igreja Católica batizar os infantes desde a sua origem. Por exemplo: O batismo da família de Estevão (1 Cor 1, 16); a família do carcereiro (At 16, 31-34); a família de Cornélio (At 10, 1s.24.44.47s); e a família de Lídia (At 16, 14-15). A pergunta lógica que faço é: Por que uma só pessoa acreditava no Evangelho e toda a sua família era batizada? Não deveria ser assim, pois nem todos criam com toda a totalidade de consciência – por exemplo as crianças – no Nome de Jesus anunciado.
Está é uma prova bíblica de que primeiramente o importante é ser batizado (iniciado) na fé de Jesus Cristo, depois o aprofundamento e o aprimoramento da fé na Salvação recebida por este rito sagrado.

Circuncisão e Batismo

No Antigo Testamento o rito que fazia do povo participante da Aliança de Deus era a circuncisão dos meninos e a apresentação das meninas. Ora, a circuncisão tinha que se dar no oitavo dia após o nascimento do menino (cf. Gn 17, 10-14). Usando a visão crítica, podemos nos perguntar: Mas as crianças não sabiam que estavam sendo circuncidadas por causa da religião de seus pais, pois elas não tinham inteligência, consciência daquele ato tão doloroso que estava acontecendo com elas. Por que não deixarem elas crescerem para optar por ser circuncidadas ou não, aceitarem a fé de seus pais ou não, para que elas gozem da liberdade de escolha da religião?
Entenderam o tamanho do problema? A resposta que tenho é: A fé é dada por herança como um tesouro de pai para filho. No Antigo Testamento os pais não queriam que seus filhos fossem desamparados do Deus que eles serviam. Eram iniciados desde os primeiros momentos de suas vidas na religião judaica como alma, vida, regra de conduta de toda a sua existência.
Para o judeu a circuncisão era um sinal corporal da pertença ao povo de Deus, bem como da sua separação do mundo circundante e participação pessoal na aliança com Deus (cf. Ex 4, 24-26).
Sendo assim, o que foi a circuncisão para os filhos de Deus no Antigo Testamento, hoje, é o Batismo para nós, novo povo de Deus do Novo Testamento. Circuncisão dar lugar ao Batismo!

Na Nova Aliança em Jesus, a circuncisão certamente perdeu o seu significado (cf. At 15, 1; Hb 8, 13; Gl 5, 3-4). Contudo, esta prática continua sendo um dos tipos do batismo: “Nele fostes circuncidados, por uma circuncisão não feita por mão de homem, mas pelo desvestimento da vossa da vossa natureza carnal: essa é a circuncisão de Cristo. Fostes sepultados com ele no batismo...” (Cl 2, 11s; cf. Fl 3,3; Rm 2, 25-29). (Revista pág. 454)

Depois de partimos da Sagrada Escritura como ponto fundamental para entendermos o motivo da Igreja batizar as crianças, como membros de Cristo, vamos nos encontrar com os primeiros Padres da Igreja Católica que não hesitaram em dar continuidade a esta tradição apostólica. Exemplos:
Orígenes (185-253),
Tertuliano (160-220,
Hipólito de Roma (170-236),
S. Irineu de Lião (130-202),
S. Gregório Nazianzeno (329-389,
S. Ambrósio (340-397),
S. Agostinho (354-430) etc.

Estes homens defenderam que “A Igreja recebeu dos Apóstolos o costume de dar o batismo mesmo aos recém-nascidos”.

Fé e Batismo

Chegando a conclusão dessa reflexão, vejo que o Batismo é o sacramento da fé. Porém, a fé que se requer para o batismo não é uma fé madura, mas um começo, que deve desenvolver-se. O Batismo é para perdão de pecados e necessário para a Salvação (At 2, 38). Crê e ser batizado, eis o ponto fundamental da vida cristã!
Em todos os seres fiéis, crianças, jovens e adultos, a fé deve crescer após o batismo. É por isso que a Igreja celebra todo ano, na noite da Vigília Pascal (Sábado Santo), a renovação das promessas batismais, para que não se perca de vista que, a cada momento de nossa vida o tesouro que recebemos pelo batismo deve ser preservado e multiplicado.

Para que a graça batismal possa desenvolver-se, é importante a ajuda dos pais. Esse é também o papel do padrinho ou da madrinha, que devem ser pessoas de fé sólida, capazes e preparados para ajudar o novo batizado, criança ou adulto, no seu caminho de vida cristã. O seu múnus é um verdadeiro ofício eclesial. Toda a comunidade eclesial tem uma parte de responsabilidade no desenvolvimento e na defesa da graça recebida no Batismo. (C.I.C. nº 1255)

Autor: Cônego José Wilson Fabrício da Silva, ocrl


Bibliografia:

Revista, Atualização: Revista de divulgação teológica para o cristão de hoje, Ano XL, nº 346, set-out, 2010.
Rosato, Philip J., Introdução à teologia dos Sacramentos, São Paulo, Loyola, 1999.
Bíblia Sagrada, Tradução CNBB, Brasília, Edit. CNBB, 2011.
Católica, Catecismo da Igreja. Petrópolis, Vozes, 1993.